A reabsorção tubular é um processo complexo e altamente regulado que envolve a movimentação de substâncias de volta para o sangue, a partir do filtrado glomerular que passa pelos túbulos renais. Este processo é fundamental para a manutenção da homeostase corporal, regulando o equilíbrio de água, eletrólitos, e outras moléculas essenciais. A reabsorção pode ocorrer por meio de dois tipos principais de transporte: ativo e passivo.
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Unidade funcional do rim em 3D. |
Transporte Ativo
O transporte ativo refere-se ao movimento de substâncias contra seu gradiente de concentração ou eletroquímico, necessitando de energia, geralmente sob a forma de ATP. Este tipo de transporte é crucial para a reabsorção de íons, glicose, aminoácidos e outras moléculas essenciais que não podem se mover passivamente através da membrana celular devido às diferenças de concentração.
Tipos de Transporte Ativo
Transporte Ativo Primário:
- Envolve o uso direto de energia na forma de ATP para mover substâncias através da membrana.
- Exemplo: A bomba de sódio-potássio (Na+/K+-ATPase), localizada na membrana basolateral das células tubulares, é um dos mecanismos mais importantes. Esta bomba transporta três íons de sódio para fora da célula e dois íons de potássio para dentro, criando um gradiente de concentração vital para muitas outras funções celulares.
Transporte Ativo Secundário:
- Utiliza a energia armazenada em gradientes de íons criados pelo transporte ativo primário. As substâncias são co-transportadas com íons como sódio.
- Exemplo: O cotransportador sódio-glicose (SGLT2) no túbulo proximal. A glicose é reabsorvida em conjunto com o sódio, utilizando o gradiente de sódio gerado pela Na+/K+-ATPase.
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Fonte: Aprendendo Fisiologia. |
Exemplos Específicos de Transporte Ativo
Reabsorção de Sódio:
- Principalmente no túbulo proximal, cerca de 65-70% do sódio filtrado é reabsorvido.
- A Na+/K+-ATPase na membrana basolateral bombeia sódio para fora da célula tubular, mantendo uma baixa concentração intracelular de sódio.
- Este gradiente de sódio facilita a entrada de sódio na célula pela membrana apical através de cotransportadores e canais iônicos.
Reabsorção de Glicose:
- O SGLT2 na membrana apical do túbulo proximal transporta glicose e sódio simultaneamente para dentro da célula.
- A glicose então sai da célula pela membrana basolateral através de transportadores GLUT, entrando no capilar peritubular.
Reabsorção de Aminoácidos:
- Semelhante à glicose, os aminoácidos são reabsorvidos no túbulo proximal via cotransportadores de sódio-aminoácidos.
- Estes transportadores utilizam o gradiente de sódio estabelecido pela Na+/K+-ATPase.
Secreção de Íons Hidrogênio e Reabsorção de Bicarbonato:
- As células intercalares no túbulo coletor secretam íons hidrogênio mediante bombas de prótons (H+-ATPase) e trocadores de H+/K+-ATPase.
- O bicarbonato é reabsorvido indiretamente: o CO2 difunde-se para dentro da célula, onde é convertido em H+ e HCO3-. O H+ é secretado no túbulo, enquanto o HCO3- é transportado para o sangue.
Transporte Passivo
O transporte passivo é o movimento de substâncias ao longo de seu gradiente de concentração ou eletroquímico, sem a necessidade de energia direta. Este tipo de transporte é fundamental para a movimentação de água, ureia e alguns íons, aproveitando as diferenças de concentração e pressão osmótica entre o filtrado tubular e o sangue.
Tipos de Transporte Passivo
Difusão Simples:
- Movimento de pequenas moléculas lipossolúveis diretamente através da membrana lipídica, sem a necessidade de proteínas transportadoras.
- Exemplo: A reabsorção de ureia no túbulo coletor e na alça de Henle.
Difusão Facilitada:
- Utiliza proteínas transportadoras específicas ou canais iônicos para mover substâncias hidrossolúveis ou íons através da membrana celular.
- Exemplo: A reabsorção de potássio por meio de canais de potássio na membrana apical das células tubulares.
Osmose:
- Movimento de água via uma membrana semipermeável em resposta a um gradiente de concentração de solutos.
- Exemplo: A reabsorção de água no túbulo proximal e na alça descendente de Henle. A presença de aquaporinas (canais de água) facilita o movimento da água.
Exemplos Específicos de Transporte Passivo
Reabsorção de Água:
- No túbulo proximal, a reabsorção de solutos cria um gradiente osmótico que promove a reabsorção passiva de água.
- A alça descendente de Henle é altamente permeável à água, permitindo que a água seja reabsorvida em resposta ao gradiente osmótico criado pelo transporte ativo de íons na alça ascendente.
Reabsorção de Cloreto e Ureia:
- Cloreto é reabsorvido passivamente no túbulo proximal, seguindo o gradiente de concentração estabelecido pela reabsorção ativa de sódio.
- Ureia é reabsorvida passivamente no túbulo coletor e na alça de Henle devido ao aumento da concentração no túbulo conforme a água é reabsorvida.
Reabsorção de Potássio e Cálcio:
- O potássio pode ser reabsorvido passivamente no túbulo proximal e na alça de Henle.
- O cálcio é reabsorvido passivamente no túbulo proximal e ativamente regulado por hormônios no túbulo distal.
Interação entre Transporte Ativo e Passivo
A reabsorção tubular é um processo integrado onde o transporte ativo frequentemente cria as condições necessárias para o transporte passivo. Por exemplo, a reabsorção ativa de sódio gera um gradiente osmótico que promove a reabsorção passiva de água. Da mesma forma, a reabsorção ativa de íons pode estabelecer gradientes de concentração que permitem a difusão passiva de outros solutos.
Regulação do Transporte Tubular
A reabsorção tubular é altamente regulada por vários fatores hormonais e locais:
Hormônios:
- Aldosterona: Aumenta a reabsorção de sódio e a excreção de potássio.
- Hormônio Antidiurético (ADH): Aumenta a permeabilidade à água no túbulo coletor, facilitando sua reabsorção passiva.
- Hormônio Paratireoide (PTH): Aumenta a reabsorção de cálcio e inibe a de fosfato no túbulo distal.
Fatores Locais:
- A concentração de solutos no filtrado tubular e no sangue peritubular influencia diretamente a reabsorção e a secreção.
- A pressão osmótica e o fluxo sanguíneo renal também desempenham papéis cruciais.
Implicações Clínicas
Distúrbios no transporte ativo e passivo podem levar a várias condições clínicas, como desidratação, desequilíbrios eletrolíticos, e acidose ou alcalose metabólica. Doenças como a síndrome de Fanconi, diabetes insipidus e a insuficiência renal crônica são exemplos de condições onde o transporte tubular é afetado, resultando em sintomas clínicos significativos.
Conclusão
O transporte ativo e passivo na reabsorção tubular é essencial para a função renal e a homeostase corporal. Entender os mecanismos subjacentes a esses processos é fundamental para a identificação e tratamento de diversas patologias renais e sistêmicas. A pesquisa contínua neste campo promete avanços no manejo de doenças relacionadas à disfunção tubular.
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Referências Bibliográficas
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